segunda-feira, 17 de março de 2008

Ilha, corpo, mulher. Ilha, encantamento


Ilha, corpo, mulher. Ilha, encantamento. Primeiro tema para
cantar. Primeira aproximação para ver-te, na carne cansada
da fortaleza ida, na rugosidade hirta do casario decrépito, a
pensar memórias, escravos, coral e açafrão. Minha ilha/vulva
de fogo e pedra no Índico esquecida. Circum-navego-te, dos
crespos cabelos da rocha ao ventre arfante e esculturo-te de
azul e sol. Tu, solto colmo a oriente, para sempre de ti exilada.
Foste uma vez a sumptuosidade mercantil, cortesão impossível
roçagando-se nas paredes altas dos palácios. Sobre a flor
árabe a excisão esboçada com nomes de longe. São Paulo.
Fadário quinhentista de «armas e varões assinalados». São
Paulo e o rastilho do envangelho nas bombardas dos
galeões. São Paulo rosa, ébano, sangue, tinir de cristais,
gibões e espadas, arfar de vozes nas alcovas efémeras. Nas
ranhuras deste empedrado com torre a escandir lamentos
dormirão os fantasmas?Almas minhas de panos e missangas
gentis,quem vos partiu o parto em tijolo ficado e envelhe-
tido?
Ilha, capulana estampada de soldados e morte. Ilha elegíaca
nos monumentos. Porta-aviões de agoirentos corvos na
encruzilhada das monções. De oriente a oriente flagelaste o
interior da terra. De Calicut e Lisboa a lança que o vento
lascivo trilou em nocturnos, espasmódicos duelos e a dúvida
retraduzindo-se agora entre campanário e minarete. Muezzin
alcandorado, inconquistável.
Porque ao princípio era o mar e a Ilha. Sindbad e Ulisses.
Xerazzade e Penélope. Nomes sobre nomes. Língua de lín-
guas em Macua matriciadas.


Luís Carlos Patraquim


In Vinte e Tal Formulações e Uma Elegia Carnívora

0 Comentários:

Postar um comentário

Assinar Postar comentários [Atom]

<< Página inicial